Considerando as alteração dos artigos 3º e 4º, ambos do Código Civil Brasileiro, pela Lei n. 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), foram modificadas de forma significativamente as hipóteses de incapacidade.
A partir da mencionada inovação, somente o menor de 16 anos é considerado absolutamente incapaz (art. 3º, CC).
Por sua vez, serão considerados relativamente incapazes: a) os maiores de 16 anos e menores de 18 anos; b) os ébrios habituais e os viciados em tóxicos; c) aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; d) os pródigos (art. 4º CC).
As mencionadas alterações trouxeram várias questões tormentosas ao dia a dia do direito notarial, pois ao tentar realizar a inclusão social das pessoas com necessidades especiais, o legislador criou verdadeiras aberrações quanto ao tema da incapacidade.
Dentre outros casos, aquele que possui deficiência mental com discernimento reduzido, passou a ter capacidade. Em outro exemplo, as pessoas que por causa transitória ou permanente e que não puderem exprimir sua vontade, agora são relativamente incapazes.
Vejamos, então o deficiente mental, que agora é considerado capaz, pode comparecer ao Tabelionato de Notas e lavrar uma procuração ou escritura de compra e venda sem representação?
E na hipótese da pessoa que está em coma, numa cama de hospital, que se encontra por causa transitória ou permanente sem poder exprimir sua vontade, sendo considerada relativamente incapaz pelo Código Civil, questiona-se: como poderá praticar o ato e ser assistida?
Não adentraremos aqui nos institutos da tomada de decisão apoiada, curatela e interdição, mas será preciso adequar a prática notarial com a atual legislação, sem permitir que aquele que não possui discernimento para praticar atos da vida civil, assim o faça sem qualquer restrição.
O que na realidade aconteceu foi uma alteração legislativa desastrosa, que colocou num mesmo patamar, sem distinção, as pessoas com necessidades especiais (deficientes físicos) e os deficientes mentais.
A doutrina pouco se manifestou a respeito, no que tange à prática nos tabelionatos e ainda não houve tempo suficiente para decisões jurisprudenciais relevantes e reiteradas, mas o tema é complexo e relevante para os que atuam no direito notarial.
Caberá ao notário aferir a real capacidade da parte e aplicar as normas em vigor para aplicar e fazer valer a segurança jurídica dos atos notariais.
Gustavo Simões Pioto, Tabelião do Tabelionato de Notas e Protesto de Títulos de Padre Bernardo-GO, desde 2014. Especialista em Direito Civil, Processual Civil e Notarial e Registral. Exerceu advocacia entre 2001 e 2014. Mestrando em Direito.
Artigo resumido publicado no Blog do DG e posteriormente publicado na íntegra na obra O Direito Notarial e Registral em Artigos, Volume III, Editora YK
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